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Comemoração do 25 de Abril – …e agora, Maria?

A GLFP CELEBROU OS 40 ANOS DO 25 DE ABRIL

COM

MARIA ISABEL BARRENO E MARIA TERESA HORTA

AUTORAS DAS “NOVAS CARTAS PORTUGUESAS”

…e agora, Maria?


FOI O TEMA DO DEBATE PÚBLICO


A propósito da comemoração dos 40 anos do 25 de abril de 74 e da condição feminina (antes e pós 25 de abril), a Grande Loja Feminina de Portugal (GLFP) organizou um debate com as escritoras Maria Isabel Barreno e Maria Teresa Horta, na Biblioteca Museu República e Resistência, no dia 12 de abril. A GLFP começou por agradecer às autoras a ousadia e a coragem guerreira que demonstraram na conceção e publicação das Novas Cartas Portuguesas, em 1972 (em conjunto com a escritora Maria Velho da Costa). Na sua primeira edição, três dias após ter sido lançada, a obra, Novas Cartas Portuguesas, foi recolhida pela censura de Marcelo Caetano e o seu conteúdo considerado pornográfico e um atentado à moral pública. Nessa obra, as autoras, por um lado, falam abertamente de temas considerados tabu na linguagem a usar pela mulher, como: o corpo, o desejo físico, a sexualidade e o prazer femininos; por outro, apresentam figuras femininas enclausuradas numa matriz cultural que as violenta de variadas formas, as maltrata, explora e engana. Mariana Alcoforado, a famosa religiosa de Beja, que é o mote das Cartas, simboliza a condição de todas as mulheres, reduzidas a uma clausura no seio de uma sociedade paternalista, em que o masculino é considerado o modelo dominante.





“Ó terra! Ó Portugal! Ó tanta largueza! Será possível que me falte o ar e na verdade esteja presa?” (Novas Cartas Portuguesas) “Vêm de longe os nossos medos, as nossas ditaduras e os retratos demiúrgicos dos nossos chefes” (Novas Cartas Portuguesas) No Portugal de então, pequenino e estreito na mentalidade vigente do respeitinho e do medo, que evitava o conflito e promovia os consensos a todo o custo, numa obediência cega à autoridade, as autoras transgrediram na voz diferenciada do feminino. Através de uma escrita ousada e despudorada questionaram o estatuto da mulher num pensamento patriarcal; denunciaram a condição existencial, cívica e jurídica da mulher na sua relação com o homem e com a sociedade em geral. Para quase todo o ato ou pensamento, antes do 25 de abril, o homem era o “dono” legítimo da mulher. “(…) sistemas de cristalizações culturais em que a mulher é imbecil jurídica, irresponsável social, homem castrado, a carne, a pecadora, Eva da serpente, corpo sem alma, virgem mãe, bruxa, mãe abnegada, vampiro do homem, fada do lar, ser humano estúpido e muito envergonhado pelo sexo, cabra e anjo, etc., etc.” (Novas Cartas Portuguesas)

As autoras transgrediram, globalmente, no discurso literário, social, político e cultural. Foi-lhes, então, instaurado um processo judicial, movido pelo próprio Estado Português. O julgamento, que se iniciou a 25 de outubro de 1973, após sucessivos incidentes e adiamentos, foi anulado devido à Revolução dos Cravos. O livro, cujo discurso de insurreição não perdeu atualidade, é considerado um marco no pensamento feminista nacional e internacional.

…E agora, Maria? Perguntaram as autoras. Decorridos 40 anos, como está a Maria, em Portugal? Algumas respostas surgiram quase de forma imediata: que há mais desemprego nas mulheres do que nos homens, que o espaço público ainda não é facilmente acessível à mulher, que a linguagem, no ensino, está repleta de sexismo. Problemas que advêm da mudança lenta das mentalidades, dos hábitos e dos costumes. Contudo, tais problemas podem observar-se em diversas partes do mundo. Para Maria Isabel Barreno o que varia, de país para país, é o tipo de opressão que é imposto, afirmando a necessidade de novas formas de luta com a definição de objetivos concretos e respetivas estratégias de ação. Para Maria Teresa Horta há que dar uma profunda atenção à linguagem, porque é através dela que o ser humano oculta e desoculta realidades. A palavra permite criar o distanciamento do que é considerado natural, desenvolvendo consciência e ação. A palavra dá visibilidade e até mesmo existência ao que acontece. A palavra sempre foi e continua a ser uma poderosíssima arma de luta.





A revolução de Abril trouxe liberdade e igualdade a diversas dimensões da vida portuguesa. Mas o discurso da igualdade no feminismo acarreta, muitas vezes, o esquecimento da diferença, da especificidade de ser mulher, exigindo-se, assim, um pensamento sobre a alteridade. E a consideração da especificidade da voz feminina pode ser uma oportunidade de encarar o outro como um presente, alguém com quem se deve dialogar, aprender e crescer; alguém que se deve encontrar, em vez de controlar ou dominar. Mulher e homem, lado a lado, na construção do que ainda não é.

“Chegará tempo de amor, em que os dois se amem sem que uso ou utilidade mútua se vejam e procurem, mas apenas prazer, prazer só, no dar e no receber? (Novas Cartas Portuguesas) O debate foi amplamente participado por uma assistência de várias gerações. As horas revelaram-se curtas para incluir todos os que ainda desejavam continuar o diálogo. Mas conseguimos visitar memórias do passado, compreendendo o presente e apontámos perspetivas para o futuro.


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